quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O OUTRO.

                Certo dia ele havia se mudado para aquela cidade pequena onde não tinha o costume de viver, era apenas um garoto, obediente, um ótimo filho, o único filho. Era reservado, não se manifestava quase nunca, não era bem uma timidez, e sim o desconforto.
                Lugares novos, rotina nova, visinhos novos, cultura nova, amigos novos e também colégio novo. Garoto inteligente, estudioso, esperto, esforçado... Colégio novo? Só ele sabia o quanto era chato mudar de colégio a cada dois, três anos. Talvez por isso fosse tão “na sua”, não carregava na bagagem os amigos que fazia, apenas a lembrança, por isso não fazia questão de se aproximar, para evitar o apego.
                Com seus dezesseis anos, ainda um pouco atrasado no colégio, foi ali, naquele ali que encontrou a única pessoa que sentia necessidade de se aproximar, de se apegar. Mas não podia ser verdade, o outro era o mais popular do colégio, e ele um “nerd” novo na cidade. Sim, o outro, era um garoto muito bonito, interessante, curioso.           
                O tempo passava e o perfume do outro ele já sentia ao passar pelo portão do colégio, e no dia da aula de laboratório o outro foi sua dupla, era uma ótima oportunidade para se aproximar, mas dali só saiu coisas da biologia, nada da física, e nem da química.
                O outro sentiu a necessidade de ser ajudado nos trabalhos de biologia, e ele foi seu professor. Passavam dias juntos, até a madrugada falando de plantas, plantas e mais plantas. O outro era muito convencido no meio de seus fãs, mas ali entre quatro paredes, apenas com ele, o outro fazia questão de ser amável. Mas na frente de todos era outro outro.
                Fim do ano chegou, e nada se falou, natal, festas... Despedida! Dessa vez, pela primeira vez sentia saudades. Mas como sempre mudar de cidade era necessário.
                Anos se passaram, estudou, trabalhou, se casou, teve filhos, filhos lindos, ótimos filhos. Mas ainda sentia o cheiro daquele perfume, escutava sua voz em seus sonhos, mas daquele amor, nunca ninguém soube.
                Agora sim, seu filho mais novo encontra aquela velha mochila que passou por várias cidades, vários colégios, carregou muitos livros, muitas roupas, muitas palavras. E naquele bolso do fundo, que mal sabia que era um bolso, com o zíper travado encontra um envelope amarelado, com destino ao seu pai no qual dizia ao final de tantas palavras – “Pra sempre te esperarei, com carinho Artur (o Outro)”.
                O medo é um ótimo inimigo.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O PRIMEIRO E O ÚLTIMO.

      Naquele dia, ali naquela rua, na menor calçada que já encontrei a gente se beijou pela primeira vez. Esse sim foi um daqueles beijos de cinema. Foi amor, porque a paixão já existia. Passamos por altos e baixos durante tudo que tivemos, voamos juntos, voamos com saudades, atravessamos o mundo, saudade veio, saudade matou, saudade nos encontrou. Vieram canadenses, paraguaios, mexicanos, peruanos, alguns brasileiros, do outro lado do Brasil, depois eles se foram, uns antes, outros depois... Uns ficaram, com um pedacinho de mim. Foram momentos jamais esquecidos, mas foram, já passaram, mas espera aí... Restam-me as fotos, os objetos trocados, os perfumes grudados, as línguas faladas (e também as esnobadas), as histórias conhecidas, os lugares visitados, e o mais importante - os Amigos conquistados. Entre muitas outras coisas.
          Foram primeiro apenas seis meses, depois um ano, e depois mais um ano. Dois anos e seis meses, tempo bastante não? Muito difícil também. Mas o que aprendi ninguém me tira.
         A Saudade passou a ser como uma dor de cabeça, sim, eu tomava um "remédio" e ela passava, mas depois vinha com mais força, e o "remédio" passou a não fazer efeito, aumentei a dose, e foi como um vício, certa quantidade já não adiantava. Até que um dia eu parei com tudo, tudo mesmo, e semana depois já não me lembrava do que sentia saudade, o que me fazia doer...
         Chegou o dia em que aquele era o meu dia, sim, o dia de voltar pra casa, a minha casa. Na noite anterior sempre tem a festa de despedida, onde é naquele momento que eu não sabia se queria voltar pra minha família biológica, ou ficar com a minha outra família, a família de um ano. E aquela sensação doía tanto, mas tanto, mas doía mesmo, era como arrancar, sem anestesia nenhuma um pedaço de mim, eu senti a queimação, depois não senti mais nada, e depois começou a latejar. E veio medo, e a agonia de deixar para trás aquelas pessoas com quem aprendi tantas coisas, aquelas pessoas que me seguraram nas minhas quedas, aquelas únicas pessoas que viraram pai, mãe, irmão, tia, tio, filho...
         Eu sai chorando, cheguei chorando por apenas lembrar que ao pousar iria encontrar com o verdadeiro pai, a verdadeira mãe, a tia, o tio, o irmão, aqueles o qual me deram essa oportunidade de ter essa outra família e também aquela pessoa no qual me lembrei que era dela que se sentia saudade. Sentia? Não sinto mais? Algum motivo especial? Talvez.
         Amei, amo... Mas nós amantes e amados temos aquele defeito de não querer nunca nos distanciar, pode ser chamado de egoísmo. Erro grande. Amor que é amor é amor de pai, amor de mãe, que mesmo com tanto amor nos liberta para o mundo para irmos atrás do que gostamos.
         Cheguei, e aquele beijo que me fez amar (?) eu já sentia o gosto, mas eu sabia que viria o último. E foi exatamente assim, os dias que nos vimos entre esses dois anos e meio não foi o suficiente, mas então porque não me acompanhou? Saudades eu senti demais, hoje ainda sinto, talvez nunca passe, mas quem sabe não nos esbarramos novamente? Poderia ser na mesma calçada onde nos beijamos pela a primeira vez, mas não para nos beijarmos novamente, isso não.
         E foi ali naquela lanchonete, que demos o último beijo, tinha o mesmo sabor do primeiro.
         Quantas coisas podem acontecer entre o primeiro e último, não?
       Mas acreditem, vão atrás de aventuras hoje, pois amanhã um compromisso mais sério com alguém pode não ser apenas uma opção, e sim uma necessidade.